terça-feira, 25 de janeiro de 2011

SOCIEDADE DE AMIGOS: TRANSMUTAÇÕES

CÃO DE GUARDA
 Paulo Cecílio

Numa tarde morta e gasta,
partias,
de um pequeno aeroporto,
ao encontro dos teus sonhos.

Sonho desde então,
tudo que não pude sonhar.

Todos os dias ligo o rádio
na hora combinada,
e não te encontro ...

Sei que anseias por me falar,
mas algo algo não te deixa.

Talvez falhem as ondas do rádio,
porque não são
como as ondas do mar...

Então, vou de novo
todos os dias ao velho aeroporto
e me desfaleço no céu azul ,
esperando, sonhando...

Imagino-te despontar
do velho pássaro de aço,
que tantas vezes partiu minha face
em riscas salgadas.

Amanhã , finalmente
tua angustia se aplacará,
e te desvencilharás do destino,
dos atropelos e  tropeços.

Então, ouvirei tua viva voz dizendo
quanto foi difícil desencontrar-me.

Dizendo que me amas ,
que nunca mais partirás.

Mas se não vieres amanhã,
                                                           tornarei a te esperar...

Naufrágio.
 Paulo Cecílio

Luta a nau de cristal...
 Nau frágil,
  rasga o mar.
na mão da brisa,
 vela range,verga,
  agita a quilha rôta.
 salpica de branco o sal,
tecendo em sêda de espuma,
                                                    o destino do navegante...




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                Fernando Yonewaya

Queria que a vida hoje
Tivesse um pouco de ar e luz

Queria que o mundo fosse
Pouco menos turvo,
pouco menos sujo

Há tantos olhos fechados
Corações cerrados
Salas sem saída
Histórias todas findas

Campo por todo lado rodeado
De opacos e duros
Vidraças e muros
Nosso corpo por todo lado carimbado
Nosso coro é sem comida
Nosso couro é sem canção

O que meus olhos agora transparecem
São gotas entaladas
Dores enlatadas

O que meus dedos apontam
São garras empedradas

Cidades sem praças
Ruas sem calçadas
Luas amargas

A tristeza
O mundo sem saída
A vida tão caída e rebaixada
Fazem a gente sentir muito frio
Fazem a gente se encolher
Virar um botão de inverno
Flor de perfume mudo

Os reativos, os reacionários
Os obedientes e cabisbaixos
Os mesquinhos e autoritários
Os maldosos de espírito ralo
Os limitados de corpo esclerosado
Os de vontade acanhada
São estes os vencedores de nosso mundo
Sempre vencem

Nós combatemos e inventamos
Uma vida de criança que mente
Um riso de noite, para um dia demente

Nós combatemos e inventamos
Para que o respiro de nossa garganta
Não cantarole melodias de ar condicionado
Nosso riso a gente dá um jeito de criar
De ter balões cheios de ar
Mas nosso riso não tem jeito de não doer

Mundo mais ainda
Cada dia sem saída
Flor ríspida de perfume mudo
Tanta gente de corpo e alma moribundos
Tanta mania de cheiro nauseabundo
Muito jeito de viver para não ter vida
Mudo mundo parco mundo
Vasto mundo de perfume duro...


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