segunda-feira, 18 de abril de 2011

O CRACK E OS CRAQUES: PERVERSÃO OU TRANSGRESSÃO; ESPETÁCULO, SIMULACRO E DILUIÇÃO...

                                                                   Jorge Bichuetti

... " tá lá um corpo estendido no chão,
em vez de uma prece uma praga de alguém;
e um silêncio servindo de amém."
Não se pode mais silenciar. A dor já uma pandemia... de lágrimas, vidas ceifadas e um caos instado no coração da vida e do mundo.
De todas as idades, homens e mulheres, pobres e ricos... a dependência química é uma chaga aberta no socius.
Diabolizar o problema é somente uma nuvem de fumaça que nos iludem e mantém a dor no seu canibal movimento de destruição e morte.
O crack agravou a dura realidade prévia... O sofrimento dos dependentes e a vulnerabilidade social de grupos e coletivos que se vêem ameaçados pelos efeitos psíquicos, sociais e ecossociais da dependência química.
Criminalizamos, discriminamos, segregamos, marginalizamos... e só aumentamos com isso a gravidade da crise instalado nas entranhas da vida.
O estado vê um crime; os moralistas, um pecado; a psicanálise, uma perversão...
O crack agrava: é voraz, rápido, é mortífero... e mais acessível, economicamente, disseminando o problema.
Não é crime; não é pecado... Sempre a humanidade usou de psicoativos para alterar seu funcionamento psíquico.
Rotelli afirma que a droga é um amplificador da consciência...
Deleuze assevera que é uma experimentação vital...
E ambos, identificam na repetição, na compulsão, no uso dependente e exagerado, um buraco negro; no buraco negro, o esvaziamento de sentido e a morte.
A psicanálise generaliza o problema o situando na falência da função paterna e num funcionamento que não suporta a falta e busca o prazer oceânico...
Uma linha... Não se pode mais pensar nas totalizações explicativas; o ser humano não se reduz a uma codificação, não somos codificáveis, somos a complexidade e a diversidade e somos a vida imersa numa realidade histórica-social...
Todos observam um elemento químico: não se produziu drogas que fossem suaves e ternas; elas se impõem e geram mecanismos químicos de tolerância e dependência...
Não é só... há a economia informal que apresenta uma funcionalidade na dinâmica do própria capitalismo.
Há a lei... que cria o submundo; pois, criminaliza, excluindo...
E há um socius cinzento, a ponto de Frei Beto afirmar que ninguém suporta a normalidade.
Vejamos outros dados...
Deleuze advoga que já não funcionamos com o desejo investido nos traços mnésícos e nos afetos com outrora foi visto pelos divãs dos psicanalistas. para ele, hoje, o desejo investe nas percepções, internas e externas... E as drogas, deste modo, incrementam o próprio desejo...
Porém, intensificam, cria uma altíssima velocidade, uma intensa e profunda desterritorialização que leva à fronteira, ao limite... Ali, se não se cria uma linha de fuga, um devir, uma vida nova... Gira-se repetidamente no uso complusivo e no abismo da morte inscrita como destino no próprio corpo...
Rotelli emerge e diz: temos que ser mais alegres, vivos, encantadores do que o universo das drogas... Só assim cuidaremos... só assim reabilitaremos e geraremos vida energizada e potente, que permitirá a libertação dos mecanismos autodestrutivos do buraco negro...
O crack pode ser enfrentado... revela-nos os que cuidam reduzindo danos e criando vida e sociabilidades alegres e solidárias... A rebeldia, a transgressão no afirmativo de uma vida insurgente, cheia de coragem e ousadia...
Há crack... e a morte no crack... Porém, não é ele o único analisador da nossa sociedade e dos nossos tempos.
Há craques.. e não nos parece que são os paradigmas da liberdade, da alteridade e da vida.
Há muita morte entremeada ao fenómeno dos craques... Contudo, são ídolos, idolatrados...São a vitória e a fama; o sucesso, os que se deram bem...
Os craques nos revelam... Vida de palco, de espetáculo... O circo não pode parar... Vida de flash, fotografias, notícias da mídia e mitos que não conseguem vive a própria humanidade...
Num tempo de simulacros... são a dissimulação do simulacro... Ou um simulacro artificial...
Num tempo de vida líquida, são a solidez do corpo-espetáculo que artifialmente encarnam um simulacro e tecem o seu drama, trama, comédia... Guardam a dor da liquidez da alma diluído nos liquidificadores da fama...
Não há como negar crack e craques são sintomas de uma sociabilidade vazia, individualista, consumista e idólatra...
Se amamos a vida e se a desejamos liberta, vitalizante e pulsante, reinventemos o mundo: criemos um mundo sociabilidade solidária, de direito à diferença e à singularidade... Reinventemos a alegria...
A tristeza, o cinza não o crack... nem rehumaniza os craques...


6 comentários:

Adilson Shiva - Rio de Janeiro - Brazil disse...

E que o que nos resta?
Continuemos como o beija-flor ...levando agua no bico para apagar o grande incendio na floresta ... vamos fazendo a nossa parte ...
O crack é voraz como todo crack ....
Um belo chamamento para essa triste realidade ...pbéns ... abraços

Adilson Shiva - Rio de Janeiro - Brazil disse...

Poema Urbano

Moço...
Não cave o poço,
O poço é fundo,
Engana o moço.
Na freguesia
Sobe e desce,
Pó e pedra,
Pintura ,esboço
De Confusão.
Olha a sirene,
Vem o Jornal,
Empurra-empurra
Sem hospital.
Vai lá não.
Placas tortas
Indicam rumos
Sem direção.
Você teimou,
Escorregou
Não levanta mais.
Cadê o chão?
A vida é osso
Quebra pescoço
tome um lençol
cubra seu rosto
Descanse em paz...
(@by Adilson S. Silva)

Adilson Shiva - Rio de Janeiro - Brazil disse...

Ai vai mais grito ... abraços

Cotidianas ...

Retrato em preto e branco
Amarelo pelo tempo
Imagens esquecidas,
Roseirais,
Sonhos,
Memórias cravadas em mim...

Retrato em preto e branco
Envelhecido pelo tempo
Imagens tremidas,
Mentes corrompidas,
Olha a poça,
Olha a lama,
Vergonha,
Sangue...
A vida não era assim...
(@by Adilson S. Silva)

Jorge Bichuetti - Utopia Ativa disse...

Adilson, a vida não era , assim... vamos no bico dos versos reinvendo a vida; belíssimos poemas, um apelo à vida de compaixão.... Abraços ternos, jorge

Anônimo disse...

Pois bem estás ai o crack, pedra objeto e não sujeito como no lugar que a colocam.
Penso na campanha que uma rede de televisão do sul do BR lançou com o lema: "Crack nem pensar" acabando com a real potencialidade do assunto que é justamente pensar ao invés de demonizar, pensar possibilidades para esse encontro singular que cada sujeito constrói com a substância. E viva a Redução de Danos!

Jorge Bichuetti - Utopia Ativa disse...

AMIGO(S), ÀS VEZES, COMO AGORA, ESCUTO AÇGO QUE ME AFETA E LEVA LOUCAMENTE A DESEJAR NOVOS RUMOS PARA OLHAR SOBRE UM BLOG: TEU COMENTÁRIOÉ UM NVO PARÁGROFO QUE ASSINO INDIGNADO PELO MUNDO E FELIZ DE SONHAR COM OUTROS,
SIM VIVA A REDUÇÃO DE DANOS...
NÃO DIABOLIZAMOS OS CRAQUES DO CAPITALISMO ; PÔ, QUE ELE RESPEITO A DOR E O SONHO DA HUMILDE GENTE, GENTEN MOSSA, O POVO DO CRACK... AMO MAIS A ELES QUE OS CRAQUES.
aBRAÇOS COM SINTONIA, TERNURA E VALENTIA, jORGE