quinta-feira, 23 de junho de 2011

BONS ENCONTROS: O LUGAR DO SOCIAL NA EXISTÊNCIA HUMANA

                       Social 

                         Amauri Ferreira


É necessário destacar a diferença que há entre um social que se banalizou, de outro que tornou-se enriquecido, que se exprime, muitas vezes, na sensação de que tivemos um dia prolífico, satisfeitos com nosso próprio trabalho, com a certeza de termos avançado ainda mais longe na nossa própria tarefa. Mas costuma-se imaginar que aqueles que falam com e como todo mundo são “sociáveis”, pois eles são facilmente identificados, facilmente tornados familiares, enquanto os outros seriam os “dissociáveis” e, justamente por isso, supostamente pagariam um preço alto por não viverem “como tudo mundo”, por não fazerem as coisas que “todo mundo faz” - e assim são acusados de viverem “isolados”. Mas não se trata de isolamento, mas de algo que é muito sutil, que não se percebe, que é ignorado freqüentemente: trata-se da capacidade seletiva de nos relacionar com as coisas que realmente nos interessa, que, inclusive, podem ser pouquíssimas, quando comparada à abertura leviana e sem seletividade vivida pela multidão. Não se constrói um mundo próprio quando se vive de maneira vulgar – em oposição a isso, o mundo selecionado de acordo com nós mesmos, devido à nossa própria potência de existir, torna a indolência difícil de suportar. Fazemos explodir a organização tirânica da vida, esta que é sustentada pela censura, culpa, sofrimento, recompensa, reconhecimento (não se conquista um mundo próprio enquanto se vive capturado pelo reconhecimento), igualdade e medo, muito medo. Como nos parecem os que se preocupam em defender a sua honra e, em razão disso, agem movidos pelo medo de serem julgados por aqueles que mais temem? Vigiam porque têm medo de quem os vigia, reprimem para sustentar a boa opinião que os vizinhos terão deles. É inevitável eles se assemelhem pela falta, pela fraqueza, pela baixeza dos seus hábitos. Por outro lado, o anonimato é signo de distinção, de liberdade, de possibilidade de perceber quem é o inimigo para que as nossas forças não sejam desperdiçadas gratuitamente. E, além disso, o anônimo faz a distinção fundamental entre pequenas e grandes questões. Grandes questões nascem quando se vê a folha de uma árvore inserida num todo: galhos, tronco, a árvore no ambiente onde vive e cresce. Grandes questões não estão dissociadas da habitação, do ar que se respira, do que se alimenta, como se ganha o seu próprio pão. Grandes questões colocam em dúvida valores que entravam a exploração de novas capacidades de agir. Já as pequenas questões, que são mais freqüentes, se contentam com a folha da árvore e ignoram o resto. Pequenas questões nos dizem que tal pessoa é assim e assado em razão disso e daquilo – e lá se vão grandes doses de energia desperdiçadas para a preservação de alguém que imagina viver desconectado do resto, de um “eu” que ora sofre, que ora está feliz, que também canta, dorme, come, que vive para se exibir. Assim as grandes questões são adiadas, pois elas não são interessantes quando o orgulho doentio à raça, ao sexo, à classe social, e demais representações, servem para manter um social banalizado.
DO BLOG: amauriferreira.blogspot.com


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