quarta-feira, 29 de junho de 2011

SOCIEDADE DE AMIGOS: UM ENCANTO DA AURORA

                                     CANTO QUE AMANHECE

Tenho barro nas mãos
e este lamento nos braços.

Nosso canto que desliza
exangue e pungente no asfalto,

desprendeu-se de nosso corpo,
- velhas noites graves rios.

Canto que amanhce grande como a rua,
com o sal da noite, mortal e frio,

para o alimento dos ossos da praça
e o incêndio, friíssimo, do mundo.

É a voz de argila e desconsolo,
candeias semi-cativas de dores

que acordam e regressam remotas fontes
e flores isentas de sangue.

No pasmo das praças vazias,
nas curvas das quebradiças tíbias,

nos olhos ermos das gentes,
no dia que floresce o mortal caminho,

é o canto que amanhece o canto,
sem vitória e sem bandeira estentida.

Pois se os mortos reclamam a terra,
os vivos, se restam, só pedem a vida.

Pobre e enorme canto que eu canto, 
barro nas mãos lamento nos braços.

Somos dois e nascemos.
Fomos dois e morremos.

                                   MOACIR LATERZA

DO LIVRO: A POESIA EM UBERABA: DO MODERNISMO À VANGUARDA / GUIDO BILHARINHO

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